1483 - 1546 |
"Ora, o último inimigo que há de ser aniquilado é a morte.
Porque todas as coisas sujeitou debaixo de seus pés. Mas, quando diz que todas as coisas lhe estão sujeitas, claro está que se excetua aquele que lhe sujeitou todas as coisas."
[1 Coríntios 15:26-27]
[1 Coríntios 15:26-27]
"...O cristão, entretanto, justamente pelo fato de ter-se tornado um cristão, está enfiado na morte e a carrega consigo a toda hora, onde quer que esteja, precisando esperá-la a todo o momento enquanto aqui viver, uma vez que o diabo, o mundo e sua própria carne não lhe dão sossego. Em contrapartida, ele tem a vantagem de já ter saído da sepultura com a perna direita e tem um poderoso assistente que lhe estende a mão, ou seja, seu Senhor Cristo, que, há muito, já saiu, dá-lhe a mão e já o retirou em mais da metade, de modo que não resta mais que o pé esquerdo. Isso, porque o pecado já lhe está perdoado e eliminado, a ira de Deus e o inferno, apagados, ele já vive totalmente em e junto a Cristo e sua parte melhor (que é a alma) participa da vida eterna; por isso, a morte não mais pode segurá-lo nem comprometê-lo, exceto que o resto, a velha pele, carne e sangue precisam decompor-se para, também, renovar-se e, também, poder seguir à alma. No mais, já chegamos totalmente à vida, porque Cristo e minha alma não mais estão na morte.
Desse consolo e obstinação, o mundo nada sabe, embora teimem e se gabem de muito dinheiro e posses, de grande prestígio, amizade e poder. Porém, diga-me uma só pessoa que, com tudo isso, pudesse depender-se da morte ou evitá-la. Ainda não houve um sequer que tivesse levado consigo a mínima coisa, um grãozinho ou um pingo d’água. Têm que ficar deitados ali, não conseguem ajudar-se com uma respirada sequer, ficando estirados eternamente em fedor insuportável, se não os enterrarem. E nenhum vermezinho seria tão inofensivo a ponto de não conseguir apoderar-se deles para devorar o cadáver. Nenhum rei jamais foi tão rico e poderoso que pudesse levar consigo toda a sua coroa e poder o equivalente a um centavo que fosse. Pelo contrário, tudo que já tiveram, eles têm que deixar aqui fora, deixando-se enterrar no túmulo, totalmente desprovidos.
Embora não muitos de nós já tenhamos saído com Cristo da morte e da sepultura de volta para a vida, temos um homem que da morte tudo levou consigo, nada perdendo por causa dela, mas tudo levou consigo, não deixando lá um fio de cabelo sequer; mas, justamente nela, ele puxou todas as coisas para si (como ele mesmo diz) e as sujeitou a si, de modo que, dele e por meio dele, também nós tenhamos que sair e, também, puxar conosco tudo o que aqui deixamos. Disso podemos nos gabar e isso, também, podemos defender contra o mundo inteiro, ainda que ridicularizem a fé e o cristianismo, fiando-se em que, agora, têm dinheiro e posses suficientes, vivendo como querem em sua ganância e toda sorte de prazeres. Mas o que vale é: vai acumulando, poupando e ajuntando numa boa, vê quem consegue desbancar o outro! Se tu tens dinheiro e posses, poder e tudo que desejas, tenta levar um centavo contigo! Mas eu quero te mostrar um Senhor que nada deixou atrás de si na morte, mas arrancou tudo [dela] e, também, me dá a mão para que eu possa arrancar também a mim. Mostra-me um homem desses em todo o mundo que, alguma vez, tenha levado consigo um fio ou o tenha trazido da morte!? Que adianta tua insistência em algo tão nulo, que não fica em teu poder sequer um momento ao chegar a morte, como se quisesses tê-lo eternamente ou levar tudo contigo?"...
Martinho Lutero - Obras Selecionadas Vol. 9. Ed. Sinodal, 2005, (O capítulo 15 da Primeira Carta de S. Paulo aos Coríntios), pgs. 354-355
Fonte - e-cristianismo
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Martinho Lutero,
Morte